Especialistas dão opiniões a favor e contra à construção de quatro sedes
Jornal O Estado de S.Paulo, 01/05/2013
Sim - Estados ficarão mais próximos da Justiça
Luciano de Souza Godoy
Qual a função principal de um Tribunal Regional Federal (TRF)? Julgar recursos e habeas corpus a partir de casos apreciados por um juiz federal. O serviço público de Justiça compõe o direito dos cidadãos e das empresas ao duplo grau de jurisdição - ter o seu caso apreciado novamente por um corpo de juízes em grau de recurso para se eliminar (ou diminuir) o erro judiciário.
Ao se perceber que há atualmente cinco TRFs no País ou, de outro lado, que 22 Estados da federação não estão próximas a um Tribunal Federal, esse fato por si só já me convence da necessidade de instalação dos novos TRFs. A questão se resolve no valor atribuído pela nossa sociedade ao Estado Democrático e ao acesso à Justiça, ao direito a um julgamento rápido e a poder participar deste.
O vício de iniciativa não há; o poder constituinte derivado foi atribuído ao Parlamento para alterar por quórum qualificado a Constituição, o que inclusive já ocorreu em relação à extinção dos Tribunais de Alçada na Reforma do Judiciário em 2005. E o custo de R$ 8 bilhões? O custo não é nem de perto esse apontado; será em torno de 10% desse valor. Todo o orçamento da Justiça Federal para o ano de 2013 é menor que isso, sendo que 80% refere-se à Justiça Federal de primeira instância (as Varas Federais), que não será redimensionada.
Por fim, o aparato de Justiça constitui despesa do Governo por ser função primária do Estado; é um custo da sociedade, como são as polícias, as Forças Armadas, os postos do INSS, a saúde pública, o programa aeroespacial, os museus, o Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan), entre vários outros exemplos possíveis. É fácil falar "não" para os novos TRFs para quem não é autor ou réu em processos, para quem não é advogado e, especialmente, para quem mora em Brasília, São Paulo, Rio de Janeiro, Recife ou Porto Alegre.
Luciano de Souza Godoy é professor da Direito GV, ex-juiz federal, advogado em São Paulo, mestre e doutor em Direito pela USP; visiting scholar pela Columbia Law School
Não - Aprovação do projeto foi inconstitucional
Roberto Dias
Não questiono a necessidade de medidas que busquem desafogar o Judiciário e viabilizem o efetivo acesso à Justiça, com segurança e rapidez. A própria Constituição impõe isso ao assegurar a todos uma tramitação célere dos processos.
Para atingir esse objetivo há vários caminhos, como a instalação da justiça itinerante, o funcionamento descentralizado dos tribunais, a edição de novas súmulas vinculantes, a decisão do Poder Público - o grande litigante brasileiro - de não recorrer em casos já pacificados pelos tribunais e a solução das controvérsias por meio de mediação e conciliação. E há, obviamente, a possibilidade de criação de novos tribunais. Todos são caminhos legítimos para alcançar aquele fim previsto constitucionalmente. Mas, os meios para atingi-lo também têm de respeitar a Constituição.
Não me parece que isso ocorreu com a aprovação do projeto de emenda que cria os novos TRFs. A própria Constituição diz que compete à cúpula do Judiciário propor ao Legislativo a criação e extinção de tribunais inferiores ou a alteração do número de seus membros. Isso é uma decorrência direta da separação de Poderes, cláusula constitucional que não pode ser atacada nem mesmo por emenda à Constituição.
Aliás, na década de 1990, o STF não permitiu a criação de tribunais estaduais por emendas às Constituições dos Estados, ou seja, sem que a proposta tivesse partido dos respectivos Tribunais de Justiça.
Isso significa que não é possível criar novos TRFs? Claro que não. Eles podem ser criados e extintos. Mas essa iniciativa deve ser do próprio Poder Judiciário, pois, do contrário, será violada a sua independência. Hoje, a maioria parlamentar quer aumentar o número de Tribunais sem ouvir o Judiciário. E se amanhã, essa maioria, incomodada pelo mesmo Judiciário, pretender extinguir Tribunais para enfraquecê-lo? Não teremos argumentos para freá-la.
Roberto Dias é coordenador do curso de Direito da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP)
Fonte: http://www.estadao.com.br/noticias/nacional,novos-tribunais-federais-sim-e-nao,1027167,0.htm
Novos Tribunais Federais: sim e não
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