Terceirização na administração pública

Virou tendência na última década do século passado a contratação de empregados via empresas terceirizadas

Por Lincoln Pinheiro Costa

 

Alguns empresários viram na contratação de empregados como pessoas jurídicas – os chamados “pj” – uma forma de burlar as normas trabalhistas e tributárias.

Evidentemente o assunto chegou ao Poder Judiciário e o TST – Tribunal Superior do Trabalho – editou a Súmula nº 331 fixando o entendimento segundo o qual a contratação de empregado por empresa interposta (terceirizada) gera vínculo diretamente com o tomador de serviços, exceto se a contratação for para seviços especializados ligados à atividade-meio do tomador, desde que inexistente a pessoalidade e a subordinação direta.

Tome-se, por exemplo, uma indústria do ramo metalúrgico: de acordo com a Justiça do Trabalho ela não pode contratar um torneiro mecânico via empresa terceirizada, mas pode contratar o serviço de vigilância; o mesmo ocorre com um clube de futebol profissional: jogador não pode ser contratado via terceirização, mas o serviço de limpeza pode.

A administração pública também acompanhou a tendência e começou a celebrar contratos com empresas terceirizadas.

O Decreto nº 2.271/97, do presidente da República, estabeleceu que as atividades de conservação, limpeza, segurança, vigilância, transportes, informática, copeiragem, recepção, reprografia, telecomunicações e manutenção de prédios, equipamentos e instalações serão, de preferência, objeto de execução indireta, ou seja, contratados via terceirização.

Acontece que a administração pública extrapolou os limites do Decreto e passou a contratar serviços que deveriam ser executados por servidores públicos, em manifesta burla ao concurso público.

Por isso, em 2007 o Ministério Público do Trabalho firmou um termo de ajustamento e conduta com o governo federal, no qual este se comprometeu a, gradativamente, realizar concursos públicos para substituir os terceirizados ilegais.

Estima-se que existam hoje, na administração pública federal, cerca de 130 mil terceirizados, o que dá a proporção de aproximadamente um terceirizado para cada 6 servidores públicos efetivos.

Com a intensa terceirização na administração pública os problemas trabalhistas vieram à reboque e o TST, adaptando a Súmula nº 331, esclareceu que havendo inadimplência das obrigações trabalhistas por parte da empresa terceirizada contratada pela administração pública, esta seria responsável subsidiariamente, desde que houvesse participado da relação processual, ou seja, desde que o empregado tivesse apresentado sua reclamação trabalhista não só contra a empresa terceirizada, mas também contra a administração pública tomadora do serviço.

Ocorre que o §1º do art. 71 da Lei nº 8.666/93 (a lei das licitações) isenta a administração pública de responsabilidade pelo pagamento de débitos trabalhistas das empresas contratadas (incluindo as terceirizadas).

A questão foi levada ao STF – Supremo Tribunal Federal – através da ADC (Ação Declaratória Constitucional) nº 16 e a Suprema Corte decidiu que o dispositivo da lei de licitações é constitucional, ou seja, que a administração pública não é responsável pelos débitos trabalhistas das empresas que ela contrata para prestação de serviços ou execução de obras.

O TST atualizou então a Súmula nº 331 esclarecendo que a responsabilidade subsidiária da administração pública pelos débitos trabalhistas das empresas terceirizadas não decorre da simples inadimplência destas, mas apenas se a administração pública, por sua conduta culposa, deixar de fiscalizar o cumprimento das obrigações contratuais e legais por parte das terceirizadas.

Nesse ínterim foi sancionada a Lei nº 12.440, de 07/07/2011 e que passou a produzir efeitos em 04/01/2012, exigindo que as empresas, para serem contratadas pela administração pública, necessitam apresentar certidão negativa de débitos trabalhistas.

A regularidade para com as obrigações trabalhistas não é exigida, por óbvio, apenas por ocasião da licitação, mas durante toda a execução do contrato, conforme reza o art. 55, XIII, da Lei nº 8.666/93.

Mas e se a empresa terceirizada não paga os salários dos empregados? A Administração pública pode reter o pagamento devido à terceirizada e pagar diretamente aos empregados desta?

O TCU – Tribunal de Contas da União – em julgamento realizado em 02/05/2012 determinou « a todas as unidades centrais e setoriais do Sistema de Controle Interno dos Poderes Executivo, Legislativo e Judiciário da União que orientem os órgãos e entidades a eles vinculados no sentido de que exijam das empresas contratadas, por ocasião de cada ato de pagamento, a apresentação da devida certidão negativa de débitos trabalhistas ».

Embora a deliberação do TCU seja recentíssima, o STJ – Superior Tribunal de Justiça – já julgou causa similar em 2011: foi o Recurso Especial nº 1241862, relatado pelo Ministro Mauro Campbell Marques, quando aquela Corte decidiu que a administração pública pode reter o pagamento devido a empresa contratada quando esta não honrar com suas obrigações trabalhistas.