Os protestos contra aumento de tarifa do transporte público que se iniciou em São Paulo e se espalhou pelo país vem recebendo muita atenção, especialmente pela brutal e covarde repressão policial que os manifestantes vêm sofrendo, mas o ponto fundamental não está sendo explorado: a questão da lucratividade das empresas de ônibus e o papel de seus donos nos financiamentos de campanhas eleitorais.
Não se pode perder de perspectiva que transporte urbano é serviço público, ou seja, trata-se de serviço essencial que é condição para o exercício de outro direito fundamental: o direito de ir e vir.
O titular desse serviço público é o município. Com a alegação de que a iniciativa privada é mais eficiente, a execução desse serviço é transferida a empresas privadas mediante contrato de concessão.
Observe, leitor, que o fato do serviço ser prestado por empresas privadas não lhe retira a natureza pública. O serviço de transporte urbano continua sendo público, ainda que praticado por empresas privadas.
A remuneração da concessionária se dá por meio de tarifas pagas pelo usuário, tarifas estas que, por imposição constitucional, devem obedecer ao princípio da modicidade.
Temos então que a tarifa de ônibus não pode ser exagerada e deve ser em valor suficiente para cobrir os custos da atividade e remunerar o capital investido pelo empresário.
Chegamos aqui a um ponto crucial e não sabemos a resposta: qual a margem de lucro das empresas de ônibus?
Para responder a essa pergunta é essencial a abertura da contabilidade das concessionárias de transporte urbano, todas elas empresas de capital fechado.
Se um empresário abre um bar e este não lhe dá o lucro desejado, ele o fecha. Acontecimento corriqueiro no mercado. Ocorre que bar não é serviço público. Este não pode ser descontinuado.
Então, como fazer se a tarifa, que tem que ser módica por imposição constitucional, não for suficiente para cobrir os custos da concessionária e ainda remunerar o empresário?
Neste caso o que se tem praticado, sem nenhuma transparência, é o subsídio. Dinheiro do orçamento municipal é transferido às empresas privadas para garantir o retorno do investimento, previsto no contrato de concessão.
Esta é a discussão a ser feita. Se a suposta eficiência da iniciativa privada não é o bastante para, com a tarifa recebida do usuário, cobrir os custos e garantir o lucro almejado, necessitando receber verba do orçamento municipal, é o próprio modelo de execução do serviço público que precisa ser colocado em xeque.
Mais barato seria a estatização do transporte coletivo, pois neste caso o subsídio recebido pela empresa pública seria apenas para cobrir os custos, não havendo, nesta empresa, o intuito de lucro.
Mas a prática de fazer perguntas leva a outras perguntas. Quais candidatos a vereador e a prefeito são financiados – direta ou indiretamente - por empresas de ônibus?
O subsídio municipal a empresas de ônibus acaba sendo um duto para se transferir recursos públicos a campanhas eleitorais, enquanto vigorar o sistema de financiamento privado de eleições.
Outra curiosidade a ser saciada é o lobby que empresários de ônibus fazem contra o transporte ferroviário.
Se estas questões não vierem à tona, terão sido em vão as agressões recebidas por manifestantes e jornalistas.
Serviço público e lucro privado
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Chegamos aqui a um ponto crucial e não sabemos a resposta: qual a margem de lucro das empresas de ônibus?